terça-feira, 15 de março de 2011

Suspenção da compra de caças e licitação.

        A presidente Dilma Roussef já se posicionou no sentido de rever o procedimento da aquisição dos caças pelo governo brasileiro (agora, a compra das aeronaves não será realizada este ano). Por oportuno, importante relembrar que o Planalto se encontrava em negociação avançada com os governos e empresas francesas, suecas e norte-americanas, sendo que, no mandato do ex-presidente Lula, havia nítida preferência pelo caça francês, o Dassault Rafale F3.
Há quase um ano, tivemos a oportunidade de nos manifestar, advogando pela necessidade de se fazer presente a devida motivação do ato de contratação, que deve ser o mais transparente possível e levar em conta eventual “valor a maior a ser pago e outros relevantes aspectos de cunho técnico, social e político”. Nessa linha concluímos que aspectos técnicos devem ser marcantes na decisão, como o parecer da FAB exarado em favor da aquisição do caça sueco Saab Gripen, documento esse que deve ser, no mínimo, incorporado à futura decisão do governo.
Afora as discussões já carreadas por nós – mais aguerridas ao aspecto da motivação da dispensa do procedimento licitatório – entendemos ser mister realçar aspectos da “vantajosidade” (I), fundamentais em sede de licitações públicas, dada a real possibilidade de se retomar o processo desde o início ou, ao menos, com a possibilidade de se aceitar novas propostas. Outro ponto relevante a ser aqui tratado, refere-se a alterações recentes na lei de licitações (II), que devem pautar os atos da administração neste momento, independente da fase na qual o processo se encontra, dado que o alcance delas chega às próprias finalidades da licitação, cuja relevância normativa é das mais marcantes. Vejamos.
Quanto ao primeiro ponto (I), um dos aspectos fundamentais no exame da vantagem a ser obtida em prol do interesse público é que a revisão do procedimento pelo governo demonstra comprometimento com o exame quantitativo (preço) da matéria, tendo-se em vista o notável vulto dos valores a serem desprendidos na aquisição dos caças, que pode chegar à casa da dezena de bilhões de reais.
O outro aspecto é o relativo ao escrutínio da qualidade do bem a ser adquirido, que se reflete na busca por contratado que entregue o bem na medida de da utilidade técnica requerida pelo interesse público. Assim sendo, podemos entrar no segundo ponto (II), relativo às alterações, dando-se destaque àquelas carreadas pela Lei n° 12.349, de 15 de dezembro de 2010. Antes dela, os princípios-macro da lei de licitações, insculpidos no caput do art. 3° da Lei de Licitações, eram os seguintes: garantia da isonomia de tratamento entre os licitantes, a sujeição à da legalidade e a busca pela proposta mais vantajosa.
Adicionalmente, referida lei alçou à mesma condição a “promoção do desenvolvimento nacional sustentável” que, a nosso ver, já restaria inserta na “vantajosidade”. Contudo, aqui a didática exige que passemos ao largo de maior discussão jurídica acerta do mérito dessa inserção. Ressalta feita, a inclusão do princípio do desenvolvimento nacional veio seguida de outras normais subjacentes, a buscar sua concreção, sendo de se destacar, para esse caso, a relativa à preferência, como critério de desempate em licitação, aos bens oriundos de empresas que invistam em pesquisa e no desenvolvimento de tecnologia no país (art 3°, parágrafo 2°, inciso IV, da Lei de Licitações).
Também destaque-se o permissivo legal de que o Edital de Licitação contemple exigência de que o contratado promova medidas de compensação diversas ou financiamentos em favor da administração. Sob o aspecto constitucional, pode-se dizer que a alteração legislativa deu, em certo grau, concreção em sede de licitações públicas aos princípios constitucionais atinentes ao desenvolvimento nacional, conforme se pode inferir no disposto no preâmbulo da Constituição, bem como de seu artigo 3°, donde está assentado que um dos objetivos da República é garantir o desenvolvimento nacional.
Muito embora, de forma geral, a tônica da lei modificadora seja a de beneficiar produtor e empresas brasileiras, o legislador não descuidou de ressaltar a importância do desenvolvimento tecnológico/científico do país, o que é mais especificamente cuidado pelo art. 218 da CF e justamente um dos pontos fulcrais na compra dos caças.
Antes do posicionamento do novo governo, ficou em cheque a preferência pelos caças franceses, significativamente mais caros que os demais, o que seria compensado por vantagens estratégicas, políticas e tecnológicas. Espera-se que o tão propagado tecnicismo da nova Presidência e de sua equipe venha a se fazer presente na gestão que ora se inicia, o que pode ser posto à prova no trato desse assunto, cuja pluralidade de valores a ser sopesada é das mais notáveis. A suspensão do processo para fins de inteiração e revisão já é um bom indicativo desse pendor e merece, até o presente momento, aplausos ou, no mínimo, o benefício da dúvida

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